STJ: Relatora restringe aplicação da nova lei que impõe revisão periódica da prisão preventiva

Notícia publicada no site do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no dia 25 de junho de 2020 (leia aqui), referente ao HC 589544.

​Para a ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Laurita Vaz, a obrigação de revisar de ofício a necessidade da prisão preventiva a cada 90 dias é imposta apenas ao juiz ou ao tribunal que decretou a medida. Segundo ela, seria desarrazoado, ou mesmo inexequível, estender essa tarefa a todos os órgãos judiciários competentes para o exame do processo em grau de recurso.

A exigência de revisão periódica da custódia preventiva está no parágrafo único do artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP), introduzido pela Lei 13.964/2019.

“Pretender o intérprete da lei nova que essa obrigação – de revisar, de ofício, os fundamentos da prisão preventiva, no exíguo prazo de 90 dias, e em períodos sucessivos – seja estendida por toda a cadeia recursal, impondo aos tribunais (todos abarrotados de recursos e entupidos de habeas corpus) tarefa desarrazoada ou, quiçá, inexequível, sob pena de tornar a prisão preventiva ‘ilegal’, é o mesmo que permitir uma contracautela de modo indiscriminado, impedindo o Poder Judiciário de zelar pelos interesses da persecução criminal e, em última análise, da sociedade” – afirmou a ministra.

A avaliação foi feita em decisão na qual Laurita Vaz negou o pedido de liminar para revogar a prisão preventiva de um homem condenado por extorsão. Segundo a defesa, a preventiva – mantida na sentença condenatória – já tem mais de um ano sem que tenha havido a revisão exigida por lei.

Meios ​​de impugnação

Relatora do habeas corpus, a ministra afirmou que a Lei 13.964/2019 atribuiu ao “órgão emissor da decisão” – em referência expressa à decisão que decreta a prisão preventiva – o dever de revisá-la a cada 90 dias, de ofício.

“A inovação legislativa se apresenta como uma forma de evitar o prolongamento da medida cautelar extrema, por prazo indeterminado, sem formação da culpa. Daí o dever de ofício de o juiz ou o tribunal processantes declinarem fundamentos relevantes para manter a segregação provisória”, explicou.

No entanto – acrescentou a ministra –, depois de exercidos o contraditório e a ampla defesa, com a prolação da sentença condenatória, o CPP prevê que o juiz – a partir de outra perspectiva acerca da culpa do réu e da necessidade da custódia cautelar – “decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta”, como preconiza o parágrafo 1º do artigo 387.

Laurita Vaz apontou que, a partir daí, encerrada a instrução do processo e prolatada a sentença ou o acórdão condenatórios, a impugnação à prisão preventiva – já então amparada em novo título judicial – poderá ser feita pelos meios recursais ordinários, sem prejuízo do uso do habeas corpus a qualquer tempo.

Interesse da soci​​​edade

Segundo a relatora, a interpretação do parágrafo único do artigo 316 do CPP “não pode extrair conclusões que levem ao absurdo”. Ela afirmou que, para questionar a prisão preventiva, a defesa dispõe de “farto acervo recursal”, além da “inesgotável possibilidade” de manejo do habeas corpus. Por outro lado – assinalou –, não se pode esquecer o “interesse da sociedade de ver custodiados aqueles cuja liberdade represente risco à ordem pública ou econômica, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal”.

Ao analisar o pedido de liminar, Laurita Vaz concluiu que a defesa não demonstrou a plausibilidade da tese segundo a qual a prisão preventiva deveria ser revogada ou substituída por medidas cautelares alternativas, apenas por não ter havido a revisão no prazo de 90 dias.

A relatora observou que o réu, sentenciado a 13 anos, teve a pena aumentada em segunda instância para 15 anos e cinco meses, e nada foi decidido no julgamento da apelação acerca da de sua situação prisional, até porque nada foi requerido sobre isso. A defesa entrou com recursos especial e extraordinário.

Segundo a ministra, as informações do processo mostram que não há ilegalidade no caso. “Muito pelo contrário, o que se vê, mesmo em juízo superficial, são razões robustas para a imposição da prisão preventiva, cujos fundamentos não foram submetidos à revisão do tribunal impetrado, razão pela qual é defeso a esta Corte Superior adiantar-se nessa tarefa, sob pena de indevida supressão de instância”, concluiu.