A análise das circunstâncias judiciais deve ser individualizada?

O art. 59 do Código Penal determina que o Juiz analise a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias, as consequências do crime e o comportamento da vítima, a fim de determinar, entre outras coisas, a pena aplicável dentre as cominadas e a quantidade de pena aplicável.

Urge lembrar que o art. 5º, XLVI, da Constituição Federal, institui a individualização da pena. Essa individualização ocorre em três momentos: legislativo (pena abstratamente cominada), judicial (pena aplicada na sentença) e executivo (pena executada).

Assim, é de se pressupor que, interpretando os dispositivos legais supracitados, a análise das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, que concretizam a individualização judicial, seriam feitas de modo – perdão pela redundância – individualizado.

Essa individualização deveria ocorrer, concomitantemente, de duas formas. De início, cada uma dessas circunstâncias judiciais precisaria ser analisada de forma separada. Além disso, deveria haver uma análise individualizada em relação a cada sentenciado, e não uma abordagem genérica para todos os corréus.

Entretanto, a grande quantidade de processos e o pouco tempo para sentenciá-los deram origem a uma jurisprudência que relativiza a necessidade de individualização da pena, sobretudo no que concerne às circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal.

Aliás, o Superior Tribunal de Justiça tem uma edição da “Pesquisa Pronta” sobre esse tema. Em um dos julgados, diz a ementa:

[…]
DOSIMETRIA DA PENA. ANÁLISE CONJUNTA PARA TODOS OS RÉUS DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ARTIGO 59 DO CÓDIGO PENAL. POSSIBILIDADE. SIMILITUDE DA SITUAÇÃO JURÍDICA-PROCESSUAL DOS ACUSADOS. EIVA NÃO CONFIGURADA.
Não se constata qualquer irregularidade ou ausência de fundamentação concreta no fato de a Corte Estadual haver analisado as circunstâncias judiciais de forma conjunta para todos os réus, pois, havendo similitude entre as suas situações jurídicas, exatamente como na espécie, o julgador não é obrigado a realizar uma dosimetria para cada um deles.
[…]
(HC 376.674/SP, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 18/05/2017, DJe 24/05/2017)

Causa estranheza o fato de a ementa explicitar que “o julgador não é obrigado a realizar uma dosimetria para cada um deles”. Ora, então a individualização da pena não significa tratar individualmente os acusados?

Em outra decisão preocupante, o STJ entendeu:

[…]
6. O princípio da individualização da pena não exige que o Magistrado, diante de réus que ostentam as mesmas circunstâncias judiciais – como no caso concreto -, realize um procedimento de dosimetria da reprimenda em separado para cada um deles, podendo, desde que o faça de forma fundamentada, agrupá-los nas razões que lhes forem comuns e justifiquem a aplicação da reprimenda naquele quantum.
7. Agravo regimental não provido.
(AgRg no Ag 1130380/MG, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 07/03/2017, DJe 14/03/2017)

Em outras palavras, o STJ decidiu que o princípio da individualização da pena não é violado em caso de agrupamento de razões.

Novamente, considero que é contraditório relacionar a individualização da pena com a fundamentação geral, coletiva ou agrupada. Não é possível individualizar algo que não considera um indivíduo, mas sim um grupo de pessoas que desempenharam ações distintas durante a prática da infração penal e possuem características heterogêneas.