“In dubio pau no réu”

Diante do comportamento punitivista de vários Juízes, é comum ouvir comentários em tom jocoso afirmando que esses Magistrados não aplicam o “in dubio pro reo”, mas sim o “in dubio pau no réu”, de modo que, quando enfrentam uma situação duvidosa, deixam de aplicar o art. 386, VII, do Código de Processo Penal, optando por condenar o acusado.

Parece que, na dúvida, muitos Juízes acreditam que é mais fácil condenar. Não há constrangimento quanto à condenação, tampouco alguma preocupação sobre o fato de enviar um potencial inocente para um sistema prisional em que esse apenado, se tiver sorte de sobreviver, deixará o cárcere após sofrer inúmeras agressões psicológicas, morais, físicas e sexuais.

O “in dubio pro réu” é substituído por um “na dúvida, o Ministério Público deve estar certo”. Creio que há o pensamento, na seara judicial, de que o Promotor não ganha mais por condenação, enquanto o Advogado normalmente recebe honorários para defender e tentar obter a absolvição. Assim, acreditam, equivocadamente, que os Promotores estão sempre certos e sem más intenções, ignorando que, às vezes, dependendo do agente, há motivos obscuros na atuação do “Parquet”.

Ou talvez isso seja feito de forma inconsciente, pela mera confiança decorrente da convivência cotidiana entre Magistrado e Promotor durante várias horas nas tardes de audiência, enquanto o Advogado, um estranho nesse ambiente, mantém pouco contato com o Magistrado, normalmente em termos protocolares.

De qualquer modo, é preocupante a desconsideração do “in dubio pro reo”, o que, em última análise, significa que, na dúvida, condena-se o réu. Noutros termos, na dúvida, o Juiz prefere “bater no réu”, mantendo sua consciência tranquila quanto ao fato de não deixar um potencial culpado impune.

Em crimes patrimoniais, por exemplo, quando alguém é encontrado com o objeto de um crime, muitos Juízes entendem que se trata de crime de furto, ignorando as várias possibilidades: receptação, encontro do objeto nas redondezas, aquisição do objeto sem saber que se trata de produto de crime etc. (leia aqui).

Na dúvida, é preferível absolver um culpado a condenar um inocente. Infelizmente, parece que os Juízes não se sentem tranquilos ao absolverem alguém, salvo se existirem provas para a absolvição. Inverte-se a lógica: a absolvição depende de provas; a condenação, da dúvida.