STJ: ofende o enunciado do non reformatio in pejus indireta o aumento da pena através de decisão em recurso especial interposto pelo Ministério Público (informativo 663 do STJ)

No RvCr 4.853-SC, julgado em 27/11/2019, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que ofende o enunciado do non reformatio in pejus indireta o aumento da pena através de decisão em recurso especial interposto pelo Ministério Público contra rejulgamento de apelação que não alterou reprimenda do acórdão anterior, que havia transitado em julgado para a acusação e que veio a ser anulado por iniciativa exclusiva da defesa (leia aqui).

Informações do inteiro teor:

O princípio da non reformatio in pejus, consagrado tanto na doutrina quanto na jurisprudência, consiste em um limitador à amplitude do julgamento, impossibilitando o agravamento da situação penal do réu na hipótese de recurso exclusivo da defesa.

Assim, em havendo recurso somente da defesa, sua reprimenda não poderá ser de qualquer modo piorada, em detrimento do réu, evitando assim a intimidação ou o embaraço do condenado ao exercício da ampla defesa. Vale dizer, o réu não pode ser tolhido no seu direito de ampla defesa por receio de ter sua situação penal agravada no caso de julgamento de recurso somente por ele provocado. Da referida regra decorre o igualmente célebre enunciado da vedação à reformatio in pejus indireta, segundo o qual deve se conferir à decisão cassada o efeito de vedar o agravamento da reprimenda nas posteriores decisões proferidas na mesma ação penal, quando a nulidade for reconhecida a partir de recurso defensivo exclusivo (ou em habeas corpus).

No caso, após a sentença condenatória, houve recurso de apelação pela defesa, tendo o Tribunal de Justiça reduzido a pena para 5 anos e 10 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto. Referida decisão transitou em julgado para ambas as partes, sendo impetrado habeas corpus pelo réu junto a este Superior Tribunal de Justiça, cuja ordem foi concedida para cassar o decisório.

Com o novo julgamento da a apelação, o Tribunal de origem novamente reduziu a reprimenda para o mesmo patamar (5 anos e 10 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto). Contra este segundo acórdão o Ministério Público interpôs recurso especial, o qual foi provido para o efeito de majorar a pena do réu para o patamar da sentença (8 anos e 4 meses de reclusão, em regime inicial fechado). Nesse diapasão, resta demonstra do que o julgado proferido no recurso especial violou o enunciado que veda a reformatio in pejus indireta, ao colocar o sentenciado em situação mais desfavorável do que aquela anterior à impetração do habeas corpus.

Confira a ementa:

PENAL E PROCESSO PENAL. REVISÃO CRIMINAL. ART. 621, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CONFIGURADA OFENSA AO ART. 617, DO ALUDIDO DIPLOMA.
REFORMATIO IN PEJUS INDIRETA. DECISÃO EM RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO QUE AGRAVA PENA DO RÉU EM PROCESSO-CRIME REABERTO POR INICIATIVA EXCLUSIVA DA DEFESA. PROCEDÊNCIA.
I – De acordo com o art. 105, I, alínea “e”, da Constituição Federal, compete ao Superior Tribunal de Justiça, processar e julgar, originariamente, “as revisões criminais e as ações rescisórias de seus julgados”.
II – A admissibilidade da revisão criminal exige o enquadramento em alguma das situações elencadas no art. 621, do Código de Processo Penal.
III – In casu, configurada a hipótese do art. 621, I, do Código de Processo Penal, ante a contrariedade da decisão prolatada em Recurso Especial ao preceito do art. 617, do aludido diploma.
IV – Ofende o enunciado do non reformatio in pejus indireta o aumento da pena através de decisão em recurso especial interposto pelo Ministério Público, contra rejulgamento de Apelação que não alterou reprimenda do acórdão anterior, que havia transitado em julgado para a acusação, e que veio a ser anulado por iniciativa exclusiva da defesa.
Revisão Criminal procedente, para restabelecer a pena fixada pelo TJ/SC no segundo julgamento do recurso de apelação.
(RvCr 4.853/SC, Rel. Ministro LEOPOLDO DE ARRUDA RAPOSO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PE), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 27/11/2019, DJe 17/12/2019)