Breve análise do crime impossível

O crime impossível está previsto no art. 17 do Código Penal, o qual prevê que “não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime”.

Segundo Greco (2017), parte-se da premissa de que o agente já ingressou na fase dos atos executórios e a consumação do fato não ocorrerá por circunstâncias alheias a sua vontade.

O que diferencia a tentativa do crime impossível é que, naquela, a consumação é possível, enquanto no crime impossível não há possibilidade de que ocorra a consumação.

A tentativa e o crime impossível também possuem uma diferença fundamental em relação à desistência voluntária, porque esta pressupõe a ausência de consumação por ato voluntário da agente, enquanto os dois outros institutos (tentativa e crime impossível) se distanciam da consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente, isto é, porque o agente, querendo continuar na execução do crime, não consegue (tentativa) ou por haver uma ineficácia absoluta do meio ou absoluta impropriedade do objeto (crime impossível).

Como referido, o crime impossível é reconhecido em duas situações: ineficácia absoluta do meio e absoluta impropriedade do objeto.

No que concerne à ineficácia absoluta do meio, o agente somente não alcança o resultado por ele inicialmente pretendido porque utilizou um meio de execução que jamais seria apto a consumar o crime.
O meio, nesse caso, deve ser entendido como tudo que seja utilizado com a pretensão de produzir o resultado desejado. Para ilustrar, há o exemplo clássico do agente que atira na vítima com uma arma que não funciona.

Por outro lado, quando o meio for relativamente ineficaz, haverá crime tentado. Sobre isso, a doutrina normalmente afirma que o meio utilizado para o crime não funciona por circunstâncias acidentais, como, por exemplo, a falha no disparo da arma de fogo. Nessa hipótese, a arma funciona, mas, na execução, falha.

Também há crime impossível diante da absoluta impropriedade do objeto. Nesse caso, entende-se como objeto tudo aquilo que sofre a conduta do agente.
Um exemplo clássico de crime impossível por absoluta impropriedade do objeto consiste na conduta daquele que atira em alguém que parece dormir, quando, na verdade, já está morto. Assim, não há o delito de homicídio, haja vista que o objeto é absolutamente impróprio para essa finalidade, pois apenas se pode causar a morte de quem esteja vivo. Logo, a consumação do crime pretendido seria impossível, razão pela qual nem mesmo haveria a punição a título de tentativa.

Por fim, o objeto relativamente impróprio consiste no objeto que é colocado efetivamente em uma situação de perigo, motivo pelo qual a conduta poderá produzir o resultado desejado pelo agente.

Por derradeiro, insta salientar que o crime impossível é uma causa de exclusão da tipicidade, pois o agente, obviamente, não responderá pelo crime na sua modalidade consumada, tampouco na forma tentada.

Uma tese comum nos crimes contra o patrimônio é a alegação de que, quando há câmeras de vigilância, seria crime impossível, porquanto não seria possível subtrair os bens sem que o agente fosse visto em ação. Assim, argumenta-se que a consumação seria impossível.

Todavia, a jurisprudência não tem aceito essa tese. Cita-se, por exemplo, uma decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

[…] CRIME IMPOSSÍVEL. Afastada a tese relativa ao crime impossível pela absoluta inidoneidade do meio empregado, até porque tal instituto somente se aplica quando da prática de crimes na forma tentada, a teor do que dispõe o artigo 17 do Código Penal. Ademais, ainda que assim não fosse, embora haja prova no sentido de que os acusados, desde a entrada no estacionamento do shopping, estavam em constante vigilância, tal circunstância, por si só, não se constitui em absoluta inidoneidade do meio empregado , até porque os acusados subtraíram os bens e empreenderam fuga do local […] (TJ/RS, Sexta Câmara Criminal, Apelação Crime Nº 70075465484, Rel. Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, julgado em 26/04/2018)

Também é oportuno mencionar que a súmula nº 567 do STJ dispõe: “Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto.”

Dessa forma, a jurisprudência é no sentido de que, isoladamente, o monitoramento eletrônico do estabelecimento não torna a conduta do agente um crime impossível.

Também é interessante mencionar a súmula nº 145 do STF, sobre a qual escreverei um texto em outro momento: “Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.”

Referência:
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral, vol. I. 19. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2017.