O erro do efeito simbólico no Direito Penal brasileiro

Não raramente, o Brasil recebe a influência de teorias e correntes doutrinárias estrangeiras. Nessa linha, a cada dia o nosso ordenamento repressivo tenta ampliar o seu efeito simbólico, de forma semelhante ao que ocorre na Europa, especialmente na Alemanha e na Espanha.

O aspecto simbólico do Direito Penal, por si só, é criticável, mas o que o caracteriza, de fato, é a sua tentativa de intimidação coletiva, afastando a sensação de anomia e demonstrando que eventuais infratores das normas penais serão severamente punidos. Como disse, a ideia, mesmo em sua origem alemã, é criticável.

O efeito simbólico do Direito Penal está vinculado à atuação legislativa, de modo sempre abstrato e genérico, emanando efeitos para o futuro. Na verdade, o simbolismo penal consiste na tentativa de, por uma intimidação geral, utilizar-se o Direito Penal como método preventivo para a resolução de problemas da sociedade atual. Abandona-se o caráter de “ultima ratio” do Direito Penal em prol de uma vertente “prima ratio”.

Normalmente, as medidas simbólicas são o aumento de preceitos secundários dos tipos penais (penas), a redução de direitos ou a expansão do Direito Penal a novas áreas (ambiental, econômica etc.).

Contudo, veja-se que, a pretexto de “enviar uma mensagem para a criminalidade”, foi publicado recentemente o Decreto do Indulto de 2016, o qual contém inúmeras regras mais restritas que seus antecessores (leia aqui). Com o aumento das frações exigidas e do número de crimes impeditivos, a diminuição de hipóteses de cabimento do indulto e a ausência da previsão de comutação, pretendia-se, por meio de uma sinalização simbólica, causar uma intimidação geral, de modo a utilizar o Decreto do Indulto como medida preventiva dentro do Direito Penal.

Ocorre que, como sabemos, a prevenção que ocorre no Direito Penal simbólico é para o futuro – algo evidente -, prospectiva e para pessoas abstratamente consideradas. No caso do Decreto do Indulto, há vários motivos para considerarmos que houve um duplo erro, ou seja, um erro por tentar utilizar o Direito Penal de forma simbólica e outro erro por utilizar o simbolismo Penal de forma equivocada. Os equívocos são:

– A restrição ao direito ao indulto não é uma medida preventiva, como exigiria o Direito Penal simbólico, mas sim retrospectiva, pois atinge fatos anteriores à publicação do Decreto;

– São atingidas pessoas concretamente consideradas, isto é, condenados que já estão cumprindo suas penas na data utilizada como parâmetro do Decreto (25 de dezembro de 2016);

– O Decreto do Indulto é tradicionalmente publicado com frequência anual. Significa que o próximo Decreto (2017) pode ser idêntico, mas também pode ser muito menos restritivo, principalmente em caso de mudança na Presidência da República. Portanto, perde-se o caráter preventivo porque as pessoas que eventualmente praticarem crimes após a edição do Decreto do Indulto de 2016 não se sujeitarão a ele, mas sim aos próximos Decretos anuais.

Isso me fez lembrar de uma palestra do lendário Robert Alexy, que assisti na UNOESC, em Chapecó/SC. Na oportunidade, ele disse que nós, brasileiros, não entendemos muito bem sua ideia de ponderação, pois utilizamos seus livros para defender a ponderação em casos que são de mera subsunção.

A situação atual do indulto é a típica hipótese de importação equivocada de uma teoria estrangeira. Tentaram tomar medidas simbólicas, que poderiam trazer calmaria ao clamor público, mas cometeram o equívoco de adotar uma medida impopular, punitivista e criticável. Pior: não a adotaram de forma correta, o que é muito mais preocupante.