A divisão da diligência em partes na investigação criminal defensiva

A divisão da diligência em partes na investigação criminal defensiva

Havendo a chance de utilização parcial dos autos da investigação defensiva, com a desconsideração de alguns/muitos trechos e páginas, deve-se ter enorme cuidado na condução da investigação e na produção dos documentos que serão juntados.

Imaginemos a seguinte situação: para provar determinado fato, o Advogado contrata um especialista em determinada área, que terá a função de realizar uma perícia. Em termos práticos, o Advogado apresentará os quesitos que deverão ser respondidos pelo perito ou que serão utilizados como parâmetro para que o profissional dirija o seu trabalho e forneça conclusões acerca do fato.

A perícia constituirá um único documento, com numeração de cada página e, normalmente, com uma sequência de quesitos e conclusões. Ao contratar a perícia, o Advogado não terá a garantia de que as conclusões serão integralmente favoráveis à defesa. É possível que a resposta a algum quesito prejudique a versão defensiva.

Nesse diapasão, é cediço que o Advogado não poderá juntar aos autos oficiais apenas uma parte da perícia. Também não poderá juntar trechos, selecionar folhas (apenas as folhas 1 a 4 e 7 a 9 do laudo pericial, por exemplo) ou rasurar o laudo para omitir as partes que prejudiquem a defesa.

Ademais, também é evidente que o Advogado, na condução de uma investigação defensiva, deverá ter ciência do direito que o investigado/réu tem de não se autoincriminar, o que deve ser observado pela defesa técnica quanto à juntada de documentos e manifestações.

Assim, surge um problema: se um documento – v. g., o laudo pericial – tiver partes favoráveis e contrárias aos objetivos da defesa, o que o Advogado deve fazer? Juntar o laudo em sua integralidade, prejudicando o acusado? Deixar de juntar o documento, abrindo mão das partes favoráveis?

Entendemos que a solução deve ser buscada antes da realização da perícia ou de qualquer outra diligência. A recomendação é realizar a cisão das diligências desde o início, dividindo-as em várias partes.

Desse modo, caso o Advogado preveja a possibilidade de uma parte das diligências ser prejudicial ao cliente, deve-se realizar uma cisão em vários atos. Se uma perícia puder gerar respostas prejudiciais à defesa, é recomendável solicitar mais de um laudo pericial. Dependendo do caso, seria possível solicitar que cada laudo abordasse poucos quesitos ou pontos, possibilitando que a defesa utilize apenas aqueles que lhe forem favoráveis, deixando de juntar aos autos oficiais os outros laudos.

Se possível, o ideal seria debater com o perito contratado sobre as várias questões que serão abordadas na perícia, inclusive mencionando o objetivo de juntar aos autos apenas pontos favoráveis. Dessa forma, o perito poderá sugerir a inclusão ou o descarte de quesitos.

Evidentemente, o Advogado jamais deverá solicitar ou determinar que o perito apresente informações inverídicas no seu laudo, tampouco que forneça conclusões com as quais não concorde. Trata-se apenas de realizar uma cisão da perícia em quantos laudos forem necessários e, se for o caso, incluir ou excluir quesitos e matérias que serão objeto da perícia.

A cisão das diligências também pode ser útil quanto à tomada de depoimentos de testemunhas. Existindo a possibilidade de que uma testemunha fale alguns pontos favoráveis e outros desfavoráveis à defesa, o ideal seria fazer mais de uma inquirição.

Dessa forma, em um primeiro depoimento, o Advogado realizaria a inquirição com perguntas que, de acordo com a previsão do Advogado, produzirão respostas favoráveis, como aquelas sobre conduta social do cliente, como se fosse apenas uma testemunha abonatória.

Havendo a possibilidade de que essa testemunha fale sobre autoria ou materialidade, mas havendo o risco de obter respostas desfavoráveis, o Advogado poderia ouvi-la em outra oportunidade, com outro registro em meio audiovisual ou por termo.

Assim, se o segundo depoimento for contrário aos interesses do cliente,  o Advogado poderá utilizar apenas o primeiro depoimento, como se a testemunha fosse apenas abonatória.

Portanto, para evitar a juntada aos autos oficiais de documentos que sejam desfavoráveis ao cliente e para não descartar documentos que tenham partes favoráveis, sugere-se a realização das diligências em várias partes.

Por outro lado, teria pouca credibilidade a juntada de apenas algumas folhas de algum documento (apenas duas ou três folhas de um laudo que tem oito páginas, por exemplo). Logo, recomenda-se a cisão no momento de realização das diligências, e não quando os documentos forem juntados.

Não precisaria ser dito, mas, apenas para reforçar, salientamos que seria antiética e, dependendo do caso, criminosa a conduta consistente em rasurar ou falsificar documentos, assim como a inserção de informações que não reflitam a realidade (v. g., inserir palavras que não foram ditas pela testemunha).